segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006

Paradoxo

Conquistei alguma coisa de bom hoje.Mesmo assim,estou agora de frente para o computador,encarando a tela,escrevendo compulsivamente sobre algo que não existe mais.Os minutos passam e não se refletem mais sobre o que penso.Minha cabeça está perdida em algum lugar entre agora e você.O mais engraçado:não te quero.E não pretendo querer nunca mais.Não para brincar na roda gigante de novo.Mas mesmo assim,as palavras são cuspidas toda hora.Na aula,na rua,em casa,no banheiro,onde for!Será possível?Não consigo esquecer alguém que já está longe e que,teoricamente,não interessaria aos meus pensamentos.
Talvez sejam mágoas.Mágoas....será que tenho?Se tiver,são mágoas bobas,que disfarcei,que escondi por não querer ficar falando nada por aí.Mas...alguma coisa mal-resolvida insiste em martelar palavras na minha cabeça.Contradição,Ambiguidade,Descaso,Humilhação...todas palavras que,não fosse minha natureza permissiva de ser,teriam me perturbado até eu mesmo dar um ponto final nas coisas.Mágoas essas que,engraçado,todos sabem e concordam,mesmo com o meu silêncio.Talvez estivesse na cara tudo.Estava no seu mundo,e você nunca no meu.E essa simples situação física de uma mente em planos diferente e a outra indiferente gerou a perda da minha personalidade para você.Para o seu mundo servir para mim.O que não se faz por amor?
Mas aí eu cheguei aí.E você não me recebeu a tempo.Fiquei apanhando para todos seus ideais e bloqueios.O pouco que nos sobrou foi investir nesse amor.
Você não investiu.
Isso,basicamente,é o tema de 99% das coisas que eu escrevo.Muito não se resolveu,e é isso que me perturba.Você pode ler,você pode não ler:já sabes do que falo,mocinha.Sabe que eu não gosto mais de você nesse sentido.Sabe quem é que gosta de você assim.Sabe o que vai acontecer conosco daqui a alguns dias.Conheces minhas mágoas todinhas de cor,assim como conheço as suas.Mas nada vai ser fator comum tanto para o que nos uniu quanto para o que nos separou.É esse mundinho canalha que nos opõe.E é ele que há de girar umas vezes e nos colocar nos eixos novamente.Vais encontrar um novo amor,e eu também,se é que já não encontramos,não é?
Mas...será que ainda lembras de mim?Eu ainda me lembro das promessas lindas e dos momentos românticos que vivemos.Tudo memória antiga,já podre e vazia,que não deveria ser lembrada.Eu ainda lembro quem você é ou era.Lembro do teu amor que saltava pela boca naquele coração acelerado...lembro de você.
Alguém tá te segurando...as presilhas ainda vão te trazer de volta a esse ponto,caso não lutes com todas as forças.Não cansa de ser tão contradita pela realidade?
A confusão que te assola é a minha,e sei o que você sente.Esse mosaico de ações planejadas faz parte do seu filme,que é o mesmo para todos.A autobiografia da nossa prisão.
Mas conquistei coisas demais hoje para largá-las por nada...

José Augusto Mendes Lobato 29/10/05

*Por ser antigo,o texto perdeu o sentido.Li ele ainda agora e cai na gargalhada =)
...se não me engano,nunca tinha postado ele... =D

sábado, 18 de fevereiro de 2006

Retratos Desfocados De Uma Geração Perdida


Dia desses estava na internet,revirando blogs e Orkuts alheios,e me vi surpreendido ao achar uma comunidade virtual dedicada a vasculhar páginas na web de pessoas que cometeram suicídio...mórbido,eu sei.E perigosamente curioso.
Eu não resisti,e deu no que deu:em alguns poucos minutos,vários rostos e diários virtuais de suicidas atolavam minha tela.Uma infinidade de jovens e adultos (esses,em quantidade irrisória se comparada à de jovens) ,fracos diante da vida,eternizados naquelas linhas de autodescrição e nos álbuns de fotos.Aprisionados nos seus rastros de vida.Alguns preferiam a discrição,optando por frases curtas e fotos desfocadas.Outros expunham seus rostos pálidos (como se já mortos) e falavam um pouco mais sobre a vida que haviam renegado.Em um garoto de dezesseis anos,um simples “cansei” respondia à pergunta “quem sou eu?”.Uma jovem universitária deixou como retórica à mesma um simples “desisti de tentar descobrir”.Ambos se suicidaram se atirando de seus apartamentos.
Quantos jovens...e quanta fraqueza!Nem mesmo a dita liberdade que lhes é concedida hoje em dia,ou as facilitações na vida afetiva que a Internet os proporciona consegue preencher o vazio em seus olhos.A dor de estar vivo,essa da qual eles se livram se atirando de edifícios ou cortando os pulsos,é eterna,e insiste em machucar seus familiares e pais.Esses acabam tendo que conviver com um sentimento de culpa que,na maioria das vezes,não lhes cabe sentir.Renegar a própria vida é entregar-se ao mais fácil,fugir da incontestável posição que temos no mundo,a de homens e mulheres que devem sofrer de cabeça erguida,apoiados na certeza de que algo de bom nos aguarda por trás da porta.
E nós quase sempre acabamos vendo nossos meninos e meninas serem hipnotizados.Se espelhando nos seus ídolos virtuais,nos seus suicidas santificados,nas drogas e,por fim,na morte.E o único legado que eles nos deixam são essas parcas linhas largadas pela Internet.
E eles são o nosso futuro.
Esses rebeldes,esses jovens pálidos,de olhos vermelhos,esses jovens suicidas.Essas frases,esses retratos desfocados.
Esses retratos de uma geração já perdida antes de nascer.

José Augusto Mendes Lobato 18/02/06

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2006

...

Dizem que o gosto da derrota é mais amargo quando é provado pelas bocas mais sujas.Bem,me parece verossímil.Eu tentei.Juro que tentei não me abalar com o baque,com o tapa que a cara já esperava em tese.Mas não dá.Como diria um grande amigo meu,o vestibular é uma forma ilusória de comprovar cientificamente o quanto somos competentes - ou não.E assim foi.Comprovada a insignificância e incapacidade deste que vos escreve,restou a ele ir para as devidas festanças,com alguns quilos de consciência latenjante nas costas e – quem diria – um sentimento de abandono incrível.Sim,pois a face sorridente afasta os pais e amigos que querem consolar,isso é fato,e nada menos consolante do que fingir não querer colo num momento tão triste e deprimente que é o de não ser aprovado para o ensino superior.
Tá,a dor vai passar,é verdade.Mas enquanto isso sou obrigado por mim mesmo,pelo meu próprio orgulho,a rir dos calouros bêbados e suas piadas,tomar refrigerante observando anos e mais anos de pressões se esvaírem das cabeças “comprovadamente” mais recheadas do que a minha,observando a nova fase das vidas deles desabrochar e eu ficar aqui,esperando o próximo busão rumo à universidade.Dói,e dói muito,e é preciso ser maduro para não converter em uma ridícula e vã inveja essa dor que sinto.Uma pena que as metáforas não possam se materializar e apenas quinze novos minutos fossem suficientes para me levar de volta aos trilhos.Mais um ano me espera.
Apostilas,livros,aulas,concorrentes,concorrência...correria,a mesma profusão de conhecimento volátil imposta pelas instituições e seus extensos conteúdos programáticos.Mas quem sabe dessa vez eu não entre bem no jogo?O gosto amargo,talvez um dia,saia da minha boca para ceder lugar ao doce sabor da satisfação,e aí eu vou dar a cara a tapa para o futuro,como quem não quer mais saber,mas já sabendo que não há nada além de produtos do nosso estudo e dedicação adiante.A vida vai ser mais tranquila quando as vitórias,mais uma vez,voltarem aos meus braços.

José Augusto Mendes Lobato 10/02/06

domingo, 5 de fevereiro de 2006


Teve um péssimo susto,o jovem.Acordou num sobressalto,encharcado no próprio suor,apalpando às cegas as paredes em volta.Finalmente,achou o interruptor e o pressionou,ainda com um fiapo de dúvida e ansiedade na cabeça.A luz se acendeu,e,para seu alívio,o quarto - aquele mesmo no qual atravessava os dias trancado - se revelou do breu.Os olhos estavam desfocados e escarlates como sempre,via-os no espelho que ficava em frente à cama,e a expressão de satisfação no seu rosto decifraria,para qualquer um,a cena que ali passara,o garoto saltando da cama,dando gritos sufocados,às cegas na escuridão noturna.Havia tido um pesadelo,e só.
Já de pé,ainda caminhando pelo quarto,como que testando todos os seus sentidos para ver se ainda funcionavam,o garoto tentou se recordar do que havia sonhado.Lembrou-se do silêncio,do breu à sua frente.De sentir o que não via,com imensa e involuntária passividade.Lembrou-se daquela névoa que lhe penetrava a vista,o impedindo de deleitar-se com o ilusório e inverossímil mundo dos seus sonhos.Esteve cego,mudo?Por quanto tempo,não sabe.Mas o que lhe pareceu uma eternidade não foram nada mais do que algumas poucas horas,a se julgar pela posição da lua,que iluminava parcamente o seu quarto.Eram o que,quatro horas da manhã?Deveria estar dormindo.Afinal,amanhã seria um dia e tanto.Mas o sono já tinha se esvaído,e sua mente estava limpa e descansada,como se um sol ofuscante já lhe banhasse o peito.
Forçou-se por alguns minutos,para recordar-se melhor do sonho.O silêncio era,de súbito,interrompido.O jovem estava sendo apalpado por uma jovem moça.Era a sua irmã.Ela chorava compulsivamente,gritando seu nome,pedia para que ele a respondesse.Mas as palavras simplesmente não saíam de sua boca,assim como os gestos que seu cérebro ordenava...o corpo não respondia.O desespero lhe subia à cabeça.Sufocado,ele sentia o ar rarefeito lhe penetrar as narinas involuntariamente,como que sem vontade,apenas mantendo a inércia da atmosfera.Várias vozes desesperadas se juntavam à dela,como um coro.Seus pais,seus irmãos,avós,amigos.A cada um queria dar uma resposta diferente,mas nada conseguia dizer.Era como um espectador,vendo tudo por através de olhos pálidos,dopados.Fracos e inertes diante de tanta vida gritando ao seu redor...
Voltou ao seu quarto.Conseguia ver,agora que seus olhos estavam se acostumando à escuridão,as seringas,as mordaças,as colheres e os frascos jogados pelo chão.Podia sentir o cheiroe a fumaça de horas atrás lhe invadindo os pulmões.E,tal qual uma criancinha amedrontada pelo irmão mais velho,o jovem se encolheu num canto do seu quarto e começou a chorar,a pensar no valor que tinha para os outros.No quanto faria falta ao mundo em que vivia para algumas pessoas,e no quanto não sentia falta de si mesmo.Nem mesmo se lembrava de ser mais do que um amontoado de células moribundas a vagar pelo mundo,enfiando a loucura e a decadência nas veias,tentando descrever aos tropeços um mundo que sabia não existir.Ficou por horas assim,chorando,tremendo e contando as estrelas do céu que iam se apagando,até um solzinho tímido ir tomando o horizonte pouco a pouco.Amanheceu sóbrio,enfim.
Quando a ambulância finalmente parou à porta,o garoto de olhos vermelhos e distantes veio caminhando tranquilamente,apoiado pelos pais e irmãos,sorrindo a todos,lhes dizendo que estaria melhor assim,"não se preocupem comigo,vou ligar todo dia".Pediu para que o visitassem bastante,como se isso já não fosse acontecer.Nem precisou ser forçado a entrar no carro.Deu um abraço e um beijo em cada um da família e sentou-se,sorridente,no banco de trás do veículo.Observou sua casa,pouco a pouco,sumir de vista,e com o mesmo sorriso de horas atrás,deixou o sono finalmente abatê-lo enquanto não chegava à clínica.

José Augusto Mendes Lobato 05/02/06