quinta-feira, 24 de abril de 2008

Nem educação, nem riqueza: o problema tá é na cultura...


Que Belém é uma cidade repleta de gente mal educada, isso todo mundo sabe – e não adianta vir dizer que isso tem apenas a ver com desenvolvimento econômico e disparidade social, o problema é mais complexo –, mas nada impede que pessoas com um mínimo de senso coletivo e respeito ao próximo, como eu, tenham surpresas cômicas (não fossem trágicas), em situações trágicas (não fossem cômicas). Eis a estória:

Numa quinta-feira chuvosa qualquer, lá estava eu no estacionamento de um grande supermercado de nossa capital. A fila de carros era imensa, e se estendia até onde os olhos podiam ver – já sentia que ia ter de dormir à espera de uma vaga. Mas uma delas surgiu do nada, bem ao meu lado. Sorte essa, hein, pensei eu.

Acendi o pisca alerta (sim, eu o uso em estacionamentos e garagens, qual o problema?) e empinei o veículo em direção à vaga, já temendo que algum espertinho me cortasse pelo vão de manobras que me separava dela. E não é que, bem na hora em que passei a primeira marcha e comecei a andar, um Fiat Siena estraçalhado, rebaixado e cheio de adesivos do Pop Som entrou na minha frente e meteu o carro na vaga?

Tentando, ainda, ter paciência e crer que aquele bendito motorista não passava de um novato distraído, joguei luz e buzinei, mas não – o cara entrou com tudo, quase leva a frente do meu carro. Aí subiu a raiva. Joguei luz, buzinei, buzinei, parei o trânsito – e, como se nada houvesse acontecido, saíram três figuras e duas meninas do carro, de óculos escuro falsificado (à noite) e cordões de alumínio dourado, rindo e me perguntando:

- Ê, cara, o que é hein?
- Como assim, o que é? Vocês se meteram na minha vaga, tava de pisca alerta entrando nela!
- Ah, vai procurar outra vaga, oras...
- Como assim?!? Vocês não têm educação?

Nessa hora, um deles bradou para quem passasse por ali: “Não, sou mal educado mesmo!”. Riram entre si. Foram embora correndo. E eu fiquei lá, só olhando aqueles três arquétipos grotescos da juventude belenense.

Às vezes me envergonho de ter nascido aqui. Às vezes me orgulho de ser diferente. Mas, na maior parte do tempo, me envergonho de ter, a cada dia, mais vontade de dar o fora dessa cidade em que ninguém se respeita – essa selva de quinta categoria, na qual a lei do mais esperto prevalece e a norma e a educação ficam para os ingênuos, bobos, lesos por definição.

Eu, graças a Deus, me incluo neste grupo – com a devida consciência de que, pobre ou rico, pós-graduado ou analfabeto, quem quiser ser uma pessoa de bem só precisa dar a preferência nas filas para quem está à frente. À maioria, deixo meus pêsames e o aviso: se um dia me avistarem dando uma de esperto, podem puxar a orelha. Afinal, ninguém é perfeito e o sangue de brasileiro, felizmente ou não, ainda corre solto em minhas veias.

* Sobre a foto: quem leu Roberto DaMatta, vai entender! Hehe =)