quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

#mudançafeelings



É legal abrir a janela do quarto às 12h40 da véspera de Natal, logo após acordar num dia de folga, e ver que o dia está chuvoso. Na verdade, todos os natais em Belém são chuvosos, já reparou? Desta vez estava com medo de ser surpreendido por um solzaço de 36 graus, já que o verão tardou a dizer tchau. Mas não - está um calorzinho suportável. Um mormaço típico dos finais de ano que já me parece meio saudoso.

Eu e Mayara nos mudamos daqui a exatos 30 dias. Lembrei disso na hora em que abri os olhos num de meus últimos finais de semana de folga. Estou de aviso prévio do jornal. Trabalho até o réveillon. Depois do dia 3, as rondas de polícia ficarão na memória. Os delegados, escrivães, colegas de trabalho, matérias especiais de domingo... tudo vai ficar por aqui. E eu vou dar o fora, após quatro anos de expectativa - feliz por me livrar de um punhado de coisas que detesto da minha terra natal, mas triste pelas perdas óbvias. Os amigos, os familiares com quem tomo café e janto (almoçar, só na copa do jornal) e, vá lá, alguns lugares.

Adoro Icoaraci. Mesmo que o distrito seja sujo, fedido, malcuidado e cercado de favelas paupérrimas, não existe melhor exemplar de orla em Belém que aquele lá do Cruzeiro. A praia fede e é imprópria para o banho, mas tem uma calçada onde bate um vento da Belém dos anos 1800. Eu e Mayara pegamos a Augusto Montenegro várias vezes nos dias de folga, só para comer no Na Telha e depois observar aquela paisagem linda, conversando sobre nossos planos para o futuro. Fumar um cigarro vendo aquelas águas barrentas é o tipo de luxo que não vou ter nos mil metros de altitude de São Paulo.

Quem acompanha esse blog sabe que eu reclamo muito daqui. É verdade - e creio que nunca vou desmentir o que já falei, a não ser que as coisas mudem (e torço muito por isso). Mas é natural que, às vésperas da mudança, comece a bater aquela pontada de pré-saudade. Aquela insegurança - meu Deus, será que quando voltar aqui as pessoas vão estar iguais? Não vou mais saber sobre todas elas? E as baixarias do submundo belenense? Só vou poder acompanhá-las nos blogs?

Esse foi um ano extremamente difícil. Perdi a minha querida avó, minha vida social e a da Mayara caíram para zero por conta do TCC, trabalhei em excesso e tive pouco tempo para dedicar a mim e à família. Tive de aturar uma série de injustiças - a mais recente praticada contra minha mãe, uma profissional exemplar - e, vá lá, várias decepções com gente de meu entorno. Mas creio que tenha sido uma espécie de provação. Acredito em Deus e em suas pequenas manobras para nos mostrar que a vida não é tão fácil assim.

Por outro lado, creio que aprendi como nunca nesse ano. Viajei muito com meu suado dinheirinho do trabalho, ganhei de presente da doutora um mês de passeio no Velho Continente, tive um monte de oportunidades sensacionais. Para mim, viagens são essenciais para que nossos olhos se abram, para que a gente amadureça. Não é à toa que meu plano de vida seja juntar grana para viver em aeroportos. Se puder me dar ao luxo, viajo todo final de semana. Melhor que trocar de carro todo mês e morar no trigésimo sétimo andar de uma torre monumental cercada de favelas. É isso.

A chegada desse Natal, já imaginava, me deixaria assim, meio saudoso e pensativo. Neste ano, a ceia vai ser aqui em casa. A vovó estará aqui, muito embora não no sentido físico da coisa. Aqui começa mais cedinho, tipo umas 20h. Depois de comer, seguimos à casa da Mayara, onde a ceia entra na madrugada. E depois é festa - se a gente tiver forças para tanta-coisa-junta-ao-mesmo-tempo-agora.

Fico de folga do jornal e da rádio até domingo. Vou aproveitar estes dias para empacotar meus CDs, DVDs e livros, pensar no que devo levar e no que fica por aqui. É uma tarefa cansativa, mas tem seu quê de fascinação; afinal de contas, já começo a pensar onde pôr esses caixotes no nosso cafofo paulistano. Meu quarto azul, com fresquíssimo papel de parede de barquinhos, vai virar o de visitas, e a minha vaga na garagem será finalmente cedida ao carro do vovô. E é isso. Decisões são decisões - e, como tais, sempre trazem aquele quê de insegurança. E fascinação.