quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Unplugged

Júlia acordou, vestiu-se e saiu de casa correndo, como de costume. Márcio a seguiu até a porta, pegou dinheiro e voltou para o quarto. Luiz estava tomando café, e via todo mundo sair de casa sabendo que nunca o faria. Olhou pela janela, e lá estavam as árvores e prédios. Sentia fome. Liege fez o nescau aguado de sempre para o menino.

Júlia chegou no trabalho e se trancafiou em uma reunião. Márcio acordou na hora do intervalo de almoço da esposa. Luiz assistia os desenhos animados da Globo, e, quando acabaram, engatou o choro. Liege chamou Márcio e os dois o calaram à força. Sob ameaças, Luiz foi para o quarto, ligou a tevê e colocou nos desenhos dos canais fechados. E deu risadas até o pai ficar bêbado.

Quando Júlia saiu do trabalho, pensou: vou levar alguma coisa para o meu menino. Comprou uma barra de chocolate da Hershey´s, daquelas bem baratinhas e gostosas, para Luiz. Chocolate o fazia ficar mais esperto, reavivava os neurônios já envelhecidos. Ao voltar para o prédio, porém, sentiu uma dor forte no peito. Encostou-se nas paredes da escada que subia todos os dias, forçou a vista que já escurecia, e subiu, a mão no seio esquerdo e a certeza de que algo corria muito, muito errado.

A casa estava a mesma coisa de antes. As taças e cristais da sala estavam cheirando a uísque. Liege limpava o vômito de Márcio na sala, a baba de Luiz do carpete, cantarolando a música nova do Calypso com um Derby em mãos. O cheiro de cigarro dava um tom meio etéreo àquela sala. Júlia havia construído a família há uns dez anos, e veja só - tudo se resumia, agora, em fracasso.

Já tonta e sentindo o ar lhe faltando, Júlia abriu a porta do quarto do menino e lá os viu, deitados. Como sempre. A criança que não crescia, o homem que a mantinha dentro de si. E a mulher que guardava segredos na intimidade. Apagou a luz, beijou os dois no rosto e foi deitar-se no outro quarto.

Um comentário:

Anônimo disse...

Continua!!! Diz que continua!!

Olha, voltei a atualizar o meu! Abraço