terça-feira, 18 de abril de 2006

História Bastante Comum.


Syd era um cara legal. Tocava em uma grande banda, guitarrista e cantor. Ainda escrevia as músicas e era um excelente aluno na faculdade. Tinha grandes sonhos nas mãos. Ser um músico famoso, escrever seu nome na história do rock n´roll, ter família e filhos. Toda a baboseira de um jovem que estava se preparando para entrar no mundo. Certo dia, horas antes de um show em sua cidade natal, descansava (era difícil conseguir descansar) e um amigo seu ligou e lhe ofereceu um artifício para lutar contra o cansaço e a tristeza. Sabia que a vida dele não corria bem: tinha problemas em conciliar a agenda da banda - que crescia a cada show - e a vida familiar andava um caos. O negócio, segundo ele, teria ótimo efeito na hora do show e seria capaz de lhe dar surtos criativos em estúdio. E tudo aquilo de graça! Syd aceitou na hora.
O show correra bem. Não lembra de nada, na verdade, mas sabe que o público adorou seu solo de guitarra de 25 minutos entre duas canções. E só parou porque o baixista lhe deu o aviso de que a casa ia fechar em breve. No outro dia, acordou com uma terrível dor de cabeça, resolvida, segundo o amigo, com um gole de uísque de boa marca. Assim ele adquirira um hábito de alcoolizar-se toda manhã.
Os meses passaram. Mas na cabeça de Syd, o tempo regredia. A cada dia se sentia mais imerso na sua infância mental, a cada dia, mais cores profusas, mais canções de amor, mais luz. Não havia quem o segurasse, para ele o mundo era aquilo, e o momento que se passava já era, por si só, uma memória distante e borrada...os shows? Não se recordava mais deles. Assim, foi ficando para o segundo plano os estudos. Mais aulas perdidas. Largou a faculdade para sair em turnê com sua banda.
Os meses que se seguiram foram o atestado de insanidade progressiva de um jovem de 23 anos. A cada dia Syd parecia perder a noção das coisas que se passavam à sua frente. O seu ar distante começou a prevalecer até mesmo nas apresentações: ele passava mal, muitas vezes sem perceber. Seus amigos de banda já se preocupavam, embora também fossem um tanto inconsequentes. Mesmo assim, seguiam em turnê.
A gota d´água aconteceu numa véspera de Natal. Num acesso de insanidade, Syd acabou destruindo todo seu apartamento e não reconhecia seus colegas de banda. Nem mesmo sua mãe - que foi o visitar no hospital - ele reconheceu. Numa visão médica, ele tinha entrado num quadro de desorientação lisérgica, e sem volta. Em resumo, estava louco.
Teve de sair da banda. Foi internado em um centro, onde vive até hoje, 40 anos após o acontecido. Syd tornou-se artista plástico, conseguindo seu ganha pão ao desenhar o mundo que vê. Arte moderna, diriam os especialistas em arte. Não reconhece seus colegas de banda, que gravaram vários discos de vendagens imensas e agora seguem em carreira solo. Não lembra como se toca guitarra, nem uma expressão se manifesta naquele rosto enquanto pinta seu rosto com tinta roxa e verde, ou quando pinta flores na parede pálida e acolchoada de seu quarto.
Porém, uma lágrima sempre cai de seu rosto quando ouve alguma música de sua banda.
Porém, sempre murmura elas baixinho no chuveiro.

José Augusto Mendes Lobato 18/04/06

História triste, mas real e frequente.
Clichê, eu sei. Mas é ou não é?

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