sábado, 6 de maio de 2006

Meninos e Meninas?

Andava de carro distraído, falando bobagens com uns amigos meus enquanto decidíamos para onde ir. Eram cerca de quatro horas da manhã, as ruas já estavam um pouco vazias, com poucos carros e pessoas passeando. E eis que pára um carro do nosso lado, cheio de adolescentes mais novos que nós. E qual não foi nossa surpresa ao ver, no banco de trás, um casal... de meninos?!?

Sim, dois meninos. Um do lado do outro. Se olhavam rapidamente e espiavam à sua volta, como que calculando a probabilidade de alguém comprometedor os ver, e de forma espontânea, com os demais amigos dentro do carro mesmo, se beijaram. Não, não de forma tórrida ou seja lá o que for. Apenas se beijaram.

Maior que meu choque em vê-los foi meu choque ao perceber que me chocava com isso. Vive-se um mundo de possibilidades e liberdades ditas quase infinitas, e, teoricamente, um casal de meninos de 14 anos deveria ser normal, assim como um de meninas. Mas, na prática, ainda há uma certa intolerância de nós, heterossexuais, com o bissexualismo. E, afinal, porque isso?

Deixando de lado a visão biológica-evolucionista, restam apenas os dogmas da Igreja. Mas, peraí. A Igreja repreende quem sente atração por pessoas do mesmo sexo, mesmo sem elas terem tido culpa de tal? A Igreja é, acima de tudo, a base de toda a sociedade atual, temos uma dívida cultural bastante polpuda com ela e tudo o que somos, temos e cultivamos nasceu da religião, de uma forma ou de outra. A negação da própria sexualidade em nome de Deus seria realmente algo saudável? Não sei. Só sei que aquele beijo não me pareceu nada indecente ou profano. Foi apenas algo incomum, uma espécie de contracultura manifesta da homogenia sexual. Pode parecer estranho, mas, ao pensar direito no que vi, me pareceu até uma atitude admirável assumir diante do resto do trânsito e do mundo um desejo que se faz presente em tantos.

Antes que joguem pedras: não, não me sinto atraído por pessoas do mesmo sexo. Apenas senti pena, pena porque sou incompreensivo mesmo lutando para não o ser (e todos são como eu). Pena porque aqueles meninos ainda irão sofrer muito. Pena pelas vidas que precisam estar ali, encarceradas dentro de suas mentes e de seua carros às quatro da manhã, pelo medo de sofrer julgamentos vagos. Acima de tudo, senti pena de mim mesmo por ter pena deles. Era a vida deles, afinal, e minha voz de nada servia, ou as pedras viriam para cima de mim e me tornaria um suposto "defensor doa gays".

E, chocado assim, mas tranquilo assim, voltei a olhar para a frente, para a cidade, enquanto o carro com o casal se distanciou na rua ao lado. Os vi se largarem um pouco, e o braço de um deles estava por trás do ombro do outro.

Nojento? Aceitável? Demoníaco? Absurdo? Natural?

Isso aí vai depender de você. Ao meu ver, não passa de um preconceito embutido em nossas cabeças de julgarmos subjetivamente quem difere objetivamente de nós.

2 comentários:

Emídio disse...

Limpo e sincero.
Legal o texto, legal discutir sobre assuntos assim que cercam a gente e muitas vezes criamos capas para não parecer isso ou aquilo.

Bacana Guto!

=D

Leandro disse...

daí quando eu falo o que eu acho errado na igreja (política de controle enfiada na cabeça desde pequeno, etc.) todo mundo me reprime e ninguém me ouve.


eu juro que eu não fiquei chocado.


o único preconceito que eu tenho é contra Canhoto

:D

ficou expressivo e objetivo o texto.

bom, bom, muito bom (Y)