terça-feira, 9 de agosto de 2011

Bebê em pílulas


A última vez em que estive em Belém foi para casar. Um corre-corre absurdo; meu voo atrasou, cheguei na véspera da cerimônia, fui quase direto para o ensaio, fiquei de um lado para outro atrás dos familiares e amigos que tão raramente a gente vê, tudo isso sem dormir direito – na verdade, eu e a Mayara só fomos descansar já no segundo dia da lua de mel. Pois é: como tudo nessa vida se repete em maior intensidade, eis que volto pra terra natal para passar pouco mais de um dia, sem contar as onze horas de avião, tudo por causa dessa coisinha pequena aí em cima. Minha primeira sobrinha.

Claro, se fosse “só” pelo título aí conquistado, não teria grandes novidades. Já havia ganhado sobrinhos homens bem antes, aos dez anos de idade. Lembro que, quando o João – que, hoje, tá mais alto que eu – nasceu, mal conseguia carregá-lo, de tanto medo de fazer alguma besteira e deixar a Rita furiosa. O Gutinho, segundo na lista, nasceu em 2005. Enfim, o status de tio, para usar um nojentíssimo jargão corporativo, "está no meu DNA" – mas dessa vez, a coisa é um pouco diferente. Moro longe de todo mundo há mais de ano e meio e sou bem mais "crescido" que antes. O peso da mudança - de qualquer mudança - é infinitamente maior.

Talvez seja por isso que tenha me sentido tão velho, aos 22 anos de idade, quando eu e a Mayara entramos na maternidade pra ver a Clarissa – a segunda-irmã-mais-velha, que separava as brigas entre a Isabela e eu e que tomava conta da casa quando nossos pais saíam – e sua cria. O quarto estava lotado de amigos dela e do Murilo; mal chegamos e o paizão já veio oferecendo vinho pra brindar, rosado como sempre. Uma festa só. Passei uns dez, quinze minutos vendo aquele bebezinho (surpreendentemente grande!) se remexer, franzir a testa e esticar as pernas no berço. Identifiquei, ali, a cara de um, o olho do outro – e a personalidade da minha irmã, tão... er... inconfundível.

O que eu e Isabela, que também mora longe da nossa família, sempre conversamos voltou à cabeça naquela hora: Belém, sabe-se lá como e por quê, deixou de ser nossa cidade. A gente gosta de rever a família, os amigos, passear nos mesmos lugares e comer nos restaurantes de sempre, mas, aos poucos, as imagens de lá são mais passado que presente; uma espécie de memória que se atualiza nas datas comemorativas e feriados passados por lá, com uma ou outra figura nova no meio de um álbum de fotos empoeirado.

Talvez por isso tenha vindo uma pontada de tristeza na primeira vez que olhei para a Betina: não vou acompanhar o crescimento dela, nem seus primeiros passos. Quando chegar lá, no Natal ou no Círio, nem a roupa que demos de presente para ela vai servir mais. Num piscar de olhos, vai estar falando meu nome, me chamando de “senhor” (que nem o João, numa postura que a Mayara acha a coisa mais “fofinha” do mundo, nos chama até hoje...), andando e dando trabalho para a Clarissa e o Murilo. De um jeito ou de outro, vamos curti-la em pílulas – mas a qualidade da convivência, e esse clichê me tranquiliza muito, depende muito mais de aproveitamento real que de quantidade de tempo.

Quando a gente decidir ter filhos por aqui, vai ser o mesmo drama, só que a 1.000 km de distância. As posições vão estar invertidas: seremos nós dois, nessa cidade grande, brigando pra criar nosso filho com toda a dignidade do mundo, contrariando a tendência pós-moderna de pais e filhos cada vez mais inconsistentes em seus papéis. Não vou dizer que tenho pressa para chegar a este dia – “mais uns dez anos...”, como diria a Mayara –, mas certamente as caras babonas da minha irmã e do Murilo diante da filha me fizeram pensar no quão gratificante pode ser colocar uma criança no mundo. Só de vê-los juntos por 24 horas, nesse último final de semana, tenho certeza de que vai tudo dar certo. E de que sou só orgulho e saudade dessa família muito unida – e, também, muito ouriçada – que tenho lá do outro lado do país.

2 comentários:

Ada Menezes disse...

Lindo, lindo, lindo! :)

Tônia disse...

aii que lindo Guto!! Fiquei emocionada!!