segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

Dois pares de olhos


Senti tua imensa dor.Senti sim,e mal conseguia olhar em seus olhos,de tão marejados de lágrimas que estavam os meus.Confesso que a dor era consolante,merecida até.Mas mal pude conter o grito quando vi aquela lâmina,brilhando à luz esverdeada,em tuas mãos.Não.Eu não pude relacionar os fatos daquela forma.Estavam te incriminando,apenas isso.As mãos estavam sujas,sim,mas era da mais pura seiva de teu corpo...não era sangue.O silêncio foi suficiente para que as pecinhas do quebra-cabeça fossem se encaixando lentamente,e a profusão de sentimentos aflorasse de minha boca.Gritei,gritos sufocados,por trás da mordaça,histéricos.Tentava te chamar de tudo que vinha à mente,mas apenas continuava a sentir aquela dor excruciante,e pedaços de mim sendo lentamente retirados pelas mãos cirúrgicas e pálidas,que um dia haviam dado às minhas um par.
A vida foi saindo de mim.O coração pulsava agonizante em suas mãos.A última coisa que vi foram seus olhos,aquelas esferas de gelo oceânico,infinitas como nunca refletidas nas lágrimas que escorriam dos meus olhos...frios como tuas mãos,a me encarar,sorrindo...
Adormeci.
E agora veja só onde estamos.Pois é,não precisa sentir medo,está tudo trancado,para o caso de algum curioso vir abrir a porta.Nunca me senti tão bem de retribuir-te o carinho que recebi de tuas mãos.Usarei a mesma arma,mas espere algo mais...lento e sutil.
Abra os olhos.Perfurarei tua pupila tal qual já fiz em sonhos por através desses séculos amaldiçoados...e a última coisa que verás serão essas minhas mãos sujas e putrefatas a te pressionar contra a cama.E estes meus olhos brancos,brancos como nuvens,sem espírito e sem alma,a fitar teu rosto e as tuas pupilas dilatadas.

José Augusto Mendes Lobato 16/01/05

2 comentários:

Emídio disse...
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Emídio disse...

Reli o texto algumas vezes... muito boa essa cena, mórbidamente romântica.
Oh Shakespeare apaixonado!
hehehe...

=)