sexta-feira, 3 de março de 2006

Nascimento, Razão e Sentido da Poesia

A mais bela das artes escritas para muitos, a poesia já contribuiu muito para a ascenção do homem. Mal se sabe a força que ela tem, a dificuldade com que ela se manteve através dos séculos. Sim, os versos lutaram por através dos séculos para coexistirem com as novas tendências de expressão humana. Os poetas morreram e deixaram seu legado para a sociedade, que foi explorando as tais “novas tendências” conforme a história era escrita. Movimentos literários definidos só surgiram por volta do século XV, com o Trovadorismo medieval. E hoje, com o Modernismo se fundindo com a estética mista do século XXI, e com os meios de comunicação explorando cada vez mais a arte escrita, resta a nós perguntar para os céus por que diabos pegamos a mania de escrever em versos o que poderia ser escrito em linhas de pergaminho.

Não se sabe ao certo, mas a suposição é que ela surge como uma forma alternativa do autor se fazer ouvir pela sociedade. Geralmente mais parciais e subjetivas, as poesias descrevem, em poucas palavras, impressões que ocupariam tediosos parágrafos de texto. De quebra, simplificadas, elas trariam um tom mais ambíguo às idéias que por elas circulam, deixando em suspenso muitos detalhes que acabariam aproximando-a de seu sentido final. Isso sem se esquecer de que a acessibilidade destas para os meios populares era maior do que a de livros imensos, que mal cabiam na mente atrofiada e simplista do povo.

A princípio, esta estética mais prática serviu para os poetas relatarem seus casos de amor e de desilusão,de forma egocêntica e idealizada. Os trovadores, como eram chamados, acabaram por apresentar a poesia para as massas, com grandes doses de humor plebeu em suas entrelinhas. Gil Vicente é o nome mais óbvio desta era. A partir de certo momento, porém, a poesia deixou de falar apenas de flores. Uma revolta contida nos pensamentos foi se transferindo para as palavras. Surgiu o engajamento poético. Desta forma, o homem começou a criticar a si mesmo. A derrubar impérios com insurreições movidas por ideais transmitidos não mais no boca-a-boca, mas sim nas palavras. Os grandes líderes eram poetas, verdadeiros idealistas e educadores de massas que sabiam falar sobre o que defendiam e sobre o que acreditavam. Suas poesias eram discursos, manifestos libertários. A poesia começava a ter uma função social mais definida.

O auge disto vem na modernidade, onde ela começa a ser vista mais como instrumento de crítica reflexiva do que como uma estética pessoalista de prosa, com o surgimento do expressionismo subversivo e idealista. Mas a grande verdade é que a poesia é mais do que “apenas” uma forma de expressão humana. Ela é uma forma de definição humana, uma forma mais confortável de se tentar descrever, analisar, romantizar ou criticar determinados caminhos que a sociedade toma enquanto constrói sua história por através dos séculos.

Estamos em constante processo de crescimento. A poesia não. Ela nasceu em tempos mais prósperos, e vem como um sopro que resgata muitos dos nossos valores perdidos em uma sociedade que supervaloriza a dimensão superficial dos fatos. As entrelinhas são resgatadas pela poesia, pela tão nobre poesia. Apesar de ter sido – e ser – usada para vários fins, ela é fixa, vem do nosso íntimo mais esquecido. Muda de contexto e estilo de linguagem, mas não de formato. Métrica, bela, a poesia permanece enquadrada na estética pura e intensa dos versos contraditórios e das metáforas. Vence a prosa por ser menos espaçosa, portanto, mais ambígua. Cala a boca dos ignorantes, dá voz aos sensíveis. É a arma dos silenciosos contra a imensidão prosaica do cotidiano. Um grito debaixo d´água, por definição.

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